sábado, 26 de novembro de 2016

Análise Política - "Pacote de Crueldades" do Governo Sartori


Matéria no Jornal Diário de Santa Maria sobre o pacote do governador Sartori.
Questão 1: Sindicatos e deputados falam que o pacote é severo e  que penaliza os servidores do Executivo. Minha pergunta é: qual plano B caberia ao Estado?
Questão 2: Além disso, queria uma abordagem com uma leitura política sobre a guinada do Estado para uma política mais à direita.  
Abaixo, para uma ampliação da leitura, segue o texto enviado, na íntegra, e a matéria do publicada.
...procurarei ser breve e atender suas questões.
1. Em primeiro lugar, não é uma questão de planos a e b, mas este é o Plano que o governo "quer" aprovar. É politicamente vantajoso para o governo, para as forças políticas que o elegeram, aprovar estas medidas. Para isso, irá barganhar na Assembleia. A crise aguda existe (nas finanças), porém estas medidas não são a solução para elas, mas sim a saída política que melhor assegura vantagens às forças que estão no Governo. Este governo penalizou mais severamente o Executivo, pois sabe muito bem o custo político de se indispor com o Judiciário e com o Legislativo. Categorias historicamente enfraquecidas e desarticuladas (professores, policiais civis, brigadianos) são os que já vem mais de perto sentindo os achaques da caneta de um Governador sem compromissos com suas pautas. Se diz muito que o Governo não tem Projeto, mas isto é uma falácia, é óbvio que há projeto: um Projeto de governo articulado com setores conservadores de economia dependente do setor privado, cujo foco é o público a serviço do privado e não seu oposto (que seria uma economia articulada público X privado trazendo ampliação de melhores condições sociais. Um verdadeiro "Plano A", neste sentido seria adotar mais severidade no combate à sonegação (sobretudo das grandes empresas, empreiteiras, transportes, que trariam mais receita; rever benefícios fiscais a empresas estrangeiras; rever salários e benefícios dos poderes judiciário e legislativo; rever a estrutura da dívida pública com o governo federal, que gasta perto da metade do que arrecada com pagamento a bancos e financiadoras privadas). Enfim, este pacote não é a saída para nenhuma crise, mas a entrada das estratégias do Estado em um viés de política neoliberal....
2. Neo liberal não se trata de um Estado mínimo, mas um Estado que milita no mercado em favor do setor privado, usando, é claro, a estrutura política, executiva e judiciária (que é pública) em favor desses mercados. Esta é a "guinada" evidente que o Governo Sartori está propondo: em seu discurso, o governador citou duas vezes (acintosamente) Margaret Thatcher, um ícone do liberalismo perverso do fim do século XX. Evidências concretas disso, no Pacote, são a investida deliberada em uma maior desarticulação dos direitos trabalhistas. Fim da licença classista, fim da remuneração a servidores que representam suas classes em sindicatos e associações, vantagens perdem perenidade e passam a ser temporárias, fim de alguns adicionais por tempo de serviço, aumento de taxas e contribuições previdenciárias, enfim, um Pacote cujo conteúdo é uma série de crueldades para quem levanta pela manhã e vai ao trabalho todo o dia; mas não para rentistas, grandes especuladores, e aqueles que se locupletam com o trabalho alheio. São medidas que vão além do que países que já adotaram também perspectivas liberais, estão fazendo. Nem mesmo eles mexem em direitos historicamente já solidificados. O Governo Sartori mexe naquilo que nem o maior defensor do capitalismo cogitaria mexer, pois são direitos já consolidados pela própria relação do trabalho com o capital. Por isso que sim! é um Governo perverso, que não busca resolver nenhuma crise, mas aumentar a dependência do Estado em relação aos mercados e aqueles que o financiam.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Pirotecnia política

Estamos acompanhando uma série de discussões e abordagens sobre a Proposta de Emenda à Constituição Federal, número 241, como se ela fosse uma peça isenta de influências político-ideológicas, ou uma questão puramente econômica; e dessa forma, pudesse ser explicada exclusivamente segundo os critérios técnicos que a constituem. Isso me parece um erro grave de abordagem e tende a esconder suas profundas determinações.
É como se fôssemos a um jogo de futebol e lá assistíssemos à comemoração de um gol pelo time dono da casa e ficássemos analisando os aspectos físico-químicos dos fogos de artifício e das bombas. Como se o que mais importasse fosse a quantidade de luzes e explosões, os números exatos da pirotecnia, as posições das quais os fogos e as bombas foram arremessadas; quando, na verdade, o que realmente importa discutir nesse caso é a importância do gol para o time, sua posição no campeonato, a habilidade dos autores da jogada do gol, e realmente o que levou àquele gol.
O mesmo acontece com esta Proposta de Emenda Constitucional que agora nos dois turnos de votação do Senado Federal passa a denominar-se PEC 55. Discutir seus números, seus parâmetros, suas taxas, seus índices, suas medidas e formas, é como discutir o som e as luzes na hora do gol, em vez do gol mesmo; isto é, em lugar de uma discussão sobre as implicações e a relevância estratégica do seu conteúdo político, sua legitimidade, suas causas e consequências, fica-se discutindo sua viabilidade técnica.

Evidentemente, não se pode prescindir de regras claras e rígidas para a condução dos gastos públicos e regimes fiscais. Mas o que importa pontuar, de fato, é que esta PEC é um gol contra a cidadania brasileira. É uma peça muito mais política do que econômica e revela, ou escond, a expressão da correlação de forças políticas que assumiram o controle da presidência desde o impedimento do governo anterior. Não se deve, por tudo isso, discutir restritamente a Proposta de Emenda à Constituição, mas de forma mais ampla e contextual, suas implicações na vida pública e econômica do país.
Publicado no Jornal Diário de Santa Maria, em 1º de novembro de 2016