Thomas Mann publicou em 1924 um dos romances mais influentes da literatura mundial do século XX. “A montanha mágica” inspira-se no tempo que o autor acompanhou, ainda jovem, o tratamento de sua esposa Katharina, em um sanatório, em Davos, nos Alpes suíços. É exatamente nesse mesmo lugar que nos finais de janeiro de cada ano personalidades de todo o mundo se reúnem para debater as questões globais mais prementes. É lá que está nesta semana o nosso presidente da república. A saída do país nesse momento tem suas razões.
Desde que assumiu o cargo, há menos de um mês, muito tem-se falado das ações do novo governo. Não parece haver precedentes de um início de gestão tão insólito e tumultuado. Mas é apenas aparência, removendo um pouco as gavetas da nossa memória encontramos, na história recente, inícios de governos muito parecidos com este que está em curso. Em “Brasil: uma biografia” a historiadora Heloísa Starling e a antropóloga Lilia Schwarcz contam que logo que assumiu a presidência, Jânio deixou claro que se saía melhor disputando votos que administrando o país. Foi um mestre nas patacoadas! Criou uniforme para o serviço público, em estilo safári, e mandou publicar no Diário Oficial. Tinha a cor bege e logo foi apelidado de “pijânio”. Vetou corridas de cavalo e rinhas de galo e para completar colocou dois burros para pastar a grama verde do Palácio da Alvorada. Como se não bastasse, preocupado com o sol forte do cerrado brasiliense, mandou colocar chapéus de palha nos animais!Collor é outro exemplo: embora também folclórico sua marca foi o impacto. Depois de uma campanha suja apoiada pelo empresariado e pala mídia, assumiu, e, no dia seguinte reuniu a equipe econômica e anunciou à imprensa um severo pacote de reformas. Bloqueava, da noite para o dia, o dinheiro das contas correntes, aplicações financeiras e cadernetas de poupança. Em campanha, alardeou que seriam os adversários que fariam isso. Era um mentiroso, como se soube depois. Congelou salários, reajustou tarifas de serviços públicos, e instaurou pânico entre a população. Não foi um começo tranquilo!
Já o atual governo não deixou por menos. Começou tão insólito quanto tumultuado. O presidente age como um autômato, uma marionete sem cordas no centro de um picadeiro em que o elenco em sua volta não é senão um esboço de sua própria mediocridade, mas é preciso considera-lo com seriedade. Ele se parece muito com Jânio e com Collor: compartilham o mesmo senso de política como espetáculo, embora por ela demonstrem desprezo; desdém pelas instituições, mas sem elas é inviável a democracia. Nenhum dos dois primeiros concluiu seu mandato. E nesta semana, assim que retornar de Davos, o chefe da nação terá muito a explicar a respeito de seu início de governo, sob pena de ter o mesmo desfecho. Talvez perceba, em tempo, que o sanatório que inspirou Thomas Mann nos Alpes é a metáfora exata do que seu governo transformou o país.
https://diariosm.com.br/colunistas/sociedade/marionete-sem-cordas-1.2119271
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