sexta-feira, 20 de junho de 2025

Templo é dinheiro

Para compreender a verdadeira natureza do neopentecostalismo, é fundamental ir além da superfície religiosa e analisar seu desenvolvimento como um fenômeno profundamente entrelaçado com a mídia e a economia. Diferente das denominações protestantes históricas ou mesmo do pentecostalismo clássico, o neopentecostalismo se distingue por uma ênfase na teologia da prosperidade, na cura divina, na batalha espiritual contra demônios e, crucialmente, no uso intensivo de estratégias de comunicação e gestão que remetem a modelos empresariais. É nesse cenário que surge a provocação: para muitos, o "tempo é dinheiro" foi substituído por uma máxima ainda mais contundente: "Templo é dinheiro".


A Gênese e Expansão Mundial: O Disfarce Religioso como Negócio

O neopentecostalismo começou a ganhar corpo nos Estados Unidos, na segunda metade do século XX, como uma ramificação do pentecostalismo, mas com características bastante peculiares. Seus fundadores e líderes rapidamente perceberam o potencial de alcance das novas tecnologias de comunicação. Rádios, televisões e, mais tarde, a internet, tornaram-se palcos para a pregação de uma mensagem focada no individualismo, na busca por bênçãos materiais e na superação de problemas através da fé – muitas vezes atrelada a contribuições financeiras. Essa mensagem, altamente adaptável e centrada nas necessidades e anseios do indivíduo, permitiu uma rápida disseminação global, especialmente em países em desenvolvimento, onde a promessa de prosperidade e soluções imediatas para crises pessoais e financeiras encontrou solo fértil. O que chamam de igrejas são, em verdade, Empresas Neopentecostais, que usam o discurso religioso, a estética da religião e até mesmo o texto bíblico como fundamento de sua movimentação pública, mas são primordialmente um movimento político e econômico.

A Chegada e Consolidação no Brasil: "Pequenas Igrejas, Grandes Negócios"

No Brasil, o neopentecostalismo desembarcou com força a partir da década de 1970, consolidando-se e crescendo exponencialmente nas décadas seguintes. Igrejas como a Universal do Reino de Deus, a Internacional da Graça de Deus e a Mundial do Poder de Deus são exemplos notórios dessa ascensão. Elas souberam explorar o vácuo deixado por outras instituições, oferecendo respostas simplificadas para dilemas complexos, e, sobretudo, dominando o espaço midiático. Canais de televisão próprios, horários nobres alugados em grandes emissoras, programas de rádio e uma presença massiva nas redes sociais são ferramentas essenciais para sua capilaridade. Essa expansão desenfreada, que ecoa a famosa frase do programa televisivo, mostra que o Brasil se tornou o cenário ideal para o que poderíamos chamar de "Pequenas Igrejas, Grandes Negócios", onde os cultos, transmitidos pela manhã na televisão, cativam seus "clientes" da mesma forma que os programas matinais de negócios. Afinal, essas entidades possuem CNPJ e gozam de várias isenções fiscais, funcionando como verdadeiras corporações.

Crentes ou Clientes? A Lógica do Consumo da Fé

Mais recentemente, essa solidificação atingiu um patamar onde o impacto social, político e econômico do neopentecostalismo é inegável. As últimas pesquisas do Datafolha, por exemplo, demonstram a velocidade dessa transformação religiosa no país. Em 2020, o número de católicos já havia caído para 50%, e a projeção é que, em um futuro próximo, o número de evangélicos no Brasil, impulsionado majoritariamente pelo neopentecostalismo, possa superar o de católicos. Esse dado não apenas reflete uma mudança demográfica religiosa, mas sinaliza a consolidação de um poder que transcende o campo da fé, inserindo-se de forma contundente na esfera pública. Nessa angulação, o que chamam de "crentes" são, em verdade, verdadeiros clientes dessas empresas, imersos em uma lógica de consumo que transfigura a espiritualidade em um produto e a fé em um investimento.


Em resumidas contas, o que testemunhamos com a ascensão do neopentecostalismo no Brasil e no mundo é muito mais do que uma simples evolução religiosa. Trata-se da consolidação de um modelo que, sob o manto da fé e o uso estratégico da estética religiosa, opera como uma intrincada rede de Empresas Neopentecostais. A lógica do mercado e da mídia se impôs, transformando templos em centros de lucro e "crentes" em "clientes". É crucial, portanto, desvendar essa fachada e reconhecer o neopentecostalismo como o poderoso fenômeno político-econômico que realmente é, para além de qualquer definição puramente teológica. A reflexão sobre "Templo é dinheiro" e as "Pequenas Igrejas, Grandes Negócios" se torna, assim, um convite urgente a uma análise mais crítica e profunda sobre o papel dessas instituições na sociedade contemporânea.